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O epidemiologista da Fiocruz-Amazônia, Jesem Orellana, que alertou autoridades do estado sobre a segunda onda em agosto de 2020, divulgou um post em seu perfil no Facebook com um pedido de ajuda.

Na postagem ele afirma que “Manaus está perdida e precisamos urgentemente de observadores internacionais independentes ligados à Organização Mundial da Saúde (OMS), Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e à Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos (CNUDH), pois não é mais possível confiar nas gestões que estão à frente da pandemia na cidade”.

O site 18h, da rádio Mix, divulgou a postagem nesta quinta-feira (21).

 

Leia a publicação

 

ALERTA EPIDEMIOLÓGICO
MANAUS ESTÁ PERDIDA E A COVID-19 EXPLODIU (20-Jan-2021)
Não há mais o que ocultar, a trágica primeira onda (https://bit.ly/2M7iBMj) e a surreal segunda onda (agosto em diante) estão entrando para a história recente das pandemias como uma das mais dramáticas experiências sanitárias e humanitárias já documentadas, ao menos em tão curto espaço de tempo. Depois de quase 40 dias, minha previsão, de que o mês de janeiro seria o “mês das lamentações e do luto” (https://bit.ly/3sLGlpY), está mais do que confirmada e, por mais desumano e monstruoso que pareça, em Manaus, capital mundial da COVID-19, não há qualquer sinal de “Lockdown”. Isto parece ser parte de um projeto que muitos insistem em não enxergar e, neste caso, Manaus é o laboratório a céu aberto, onde todo tipo de negligência e barbaridade é possível, sem punição e qualquer ameaça à hegemonia dos responsáveis pela (não) gestão da epidemia nos mais diferentes níveis. A regra parece ser deixar o vírus correr livre, horrorizando a humanidade, com direito a nova variante cujas consequências são imprevisíveis.
Embora saibamos que a subnotificação é um grave problema em Manaus (https://bit.ly/3obuiz7), conforme se observa na Figura 1, somente nos primeiros 20 dias de janeiro de 2021, ocorreram em torno de 945 óbitos por COVID-19, quase a mesma quantidade do que a somatória de mortes por COVID-19 entre agosto(início da segunda onda) e dezembro de 2020. Esclareço que esse número tende a aumentar nas próximas semanas/meses, devido ao andamento das investigações de óbitos e/ou ao lançamento/atualização de dados “represados”.
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Outro indicador que reflete a gravidade da epidemia é o explosivo número de sepultamentos entre 13 e 19 de janeiro de 2021, com uma média diária de 191, um padrão inédito na história de Manaus e quase 6 vezes maior do que o padrão habitual. A média diária de mortes em domicílio, um fenômeno fortemente observado na primeira onda (https://bit.ly/3obuiz7e https://bit.ly/2M7iBMj), entre 13 e 19 de janeiro de 2021, foi de aproximadamente 27. É interessante refletir sobre o indicador de mortes em domicílio, já que Manaus chocou a humanidade em 14 de janeiro, quase que exclusivamente, pelo fato de suas enfermarias hospitalares terem sido transformadas em espécies de “câmaras de asfixia”, já que dezenas de vítimas foram a óbito sem oxigênio medicinal. Não foi coincidência Manaus ter sepultado, inacreditavelmente, 213 mortos no dia seguinte.
No entanto, este evento surreal e sem paralelo durante a pandemia, acabou ocultando outro problema até mais trágico e desesperador, o das dezenas de pessoas que foram a óbito em casa sufocadassem assistência médica, que ficaram à deriva ao sabor do maior mercado paralelo de oxigênio medicinal para uso domiciliar. Apenas para ilustrar um fragmento dessa tragédia, lembro que entre os dias 13 e 19 de janeiro de 2021, em média, 27 pessoas morreram em casa, sendo que boa parte pode ter acabado sufocada e ocasionado danos psicológicos irreversíveis em familiares e entes queridos. Lembro que esse tipo de morte sem assistência médica tem acontecido com frequência e deve continuar. Imaginem nos 61 municípios do interior do Amazonas, onde as pessoas também morrem asfixiadas e não existe leito de UTI?
Em termos de adoecimento e novas infecções pelo novo coronavírus, Manaus quebrou outro recordeem 20 de janeiro de 2020, o de casos notificados por COVID-19, com um total de 3.632 registros (https://glo.bo/2Nq83sn), o que inclui os aterrorizantes casos associados a nova e ameaçadora variante (https://bit.ly/2Y1Pmxfe https://bit.ly/3o2CLUY), para nossa vergonha, identificada pelo Ministério da Saúde do Japão, semanas depois de sua provável emergência no Amazonas. Outro sinal claro do fracasso de nossa vigilância laboratorial no Brasil, em especial em Manaus.
Não é mais aceitável que se acredite na descabida tese da imunidade de rebanho pela via natural em Manaus (https://bit.ly/39NAfwV e https://bit.ly/2KywNxr) ou em tratamentos inexistentes/precoce (https://bit.ly/3nZENVTe https://glo.bo/39QaNXx). Embora a vacinação contra a COVID-19 seja uma alentadora realidade, seus efeitos só poderão ser sentidos daqui a alguns meses, o que significa que, no curto prazo, precisamos de medidas em caráter tempestivo e emergencial. Ou se decreta um severo “Lockdown” em Manaus, com ao menos 21 diasde duração, ou veremos esta tragédia se aprofundar ainda mais, ceifando centenas de vidas e causando mais sofrimento e dor para milhões de Amazonenses e angústia na humanidade como um todo. Precisamos urgentemente de observadores internacionais independentes ligados à Organização Mundial da Saúde (OMS), Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e à Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos (CNUDH), pois não é mais possível confiar nos diferentes níveis de gestão que estão à frente da epidemia em Manaus.
Precisamos, salvar vidas e não aprofundar a tragédia sanitária e humanitária (https://bit.ly/35zCnHa) de 2020 em 2021. É nosso dever defender a boa ciência e o SUS! Vidas importam!
Jesem Orellana
Epidemiologista-FIOCRUZ/Amazônia
Foto: Divulgação