Maternidade x Esporte: atletas denunciam falta de apoio e frustrações
A decisão de engravidar para mulheres atletas não é escolha fácil. Para atletas de alto rendimento, que lidam diretamente com a performance, a questão é ainda mais profunda. Atletas e ex-atletas lidam com a dúvida, o medo do retorno, a frustração, a falta de apoio, e tantos outros dramas que diversas mulheres precisaram enfrentar no esporte.
Thaísa
Congelamento de Óvulos
Entre os exemplos está a bicampeã olímpica de vôlei Thaísa Daher. Aos 35 anos, a central está se preparando para mais uma Olimpíada na carreira e não pretende parar no momento para realizar o sonho de ser mãe. No entanto, a futura gravidez precisou ser planejada. Como o relógio biológico nem sempre funciona a favor de quem decide por ser mãe com idade mais madura, a jogadora usou da tecnologia.
Em julho, Thaísa decidiu congelar os óvulos para poder seguir jogando e postergar a “parada” na profissão. Com a consciência das consequências quando uma atleta anuncia a gravidez, Thaísa sabe dos próximos desafios que a esperam.
Falta de apoio
– Tem muitos lugares que você engravidou, acabou a temporada. Eles vão te dar um pé na bunda “tchau, obrigada. Você não vai mais servir pra gente esse ano”. Dependendo da mentalidade de quem tá gerindo o time e o clube, não vai ser bem assim que vai funcionar. Você pode até gerar uma indisposição com o clube porque ele está pagando por alguém que deveria estar em quadra e não vai estar – disse em entrevista para a série.
Decisão difícil
O sonho de ser mãe já existe há anos na vida de Thaísa. A jogadora imaginava ver seus filhos na arquibancada enquanto estaria em quadra, mas as escolhas que precisou fazer ao longo da carreira tiveram de empurrar a concretização do sonho de formar família. Uma decisão difícil que permeia a vida de muitas atletas.
– O triste eu acho que é isso: eles vêem a gente como super mulheres e máquinas para defender nosso país, para jogar, para dar nosso melhor, mas ninguém pensa nesse lado humano de querer ser mãe… no sonho de querer ter uma família – comentou a jogadora.
Foto: Wander Roberto/Inovafoto/CBV
Tandara
Direitos trabalhistas
Lidar com a falta de apoio e desigualdades fez da companheira de seleção, Tandara, ir à justiça para brigar por direitos trabalhistas. Em 2015, quando estava grávida de Maria Clara, passou a receber apenas o valor previsto em carteira pelo então empregador da jogadora, o Praia Clube. O acordo de “direito de imagem”, que correspondia a 99% dos rendimentos, não foi renovado.
Tandara foi a primeira atleta brasileira a entrar na Justiça para brigar por esse tipo de reconhecimento de direitos ligados a gravidez.
– A atleta que tem carteira assinada, tem as mesmas garantias que a legislação trabalhista concede a qualquer mulher. O artigo 391 da CLT diz que nenhuma mulher pode ser dispensada quando estiver grávida – explicou a advogada do caso, Silvia Pérola, que acredita abrir precedentes para que outras atletas possam reivindicar seus direitos perante a lei.
Ato para corajosas
Apesar do primeiro caso vitorioso no país, a advogada afirma que optar por um trabalho no desporto é para corajosas.
– Muitas jogadoras não recorrem por medo, porque, realmente, qual clube vai contratar? Fora a questão da retaliação. É uma questão real. A gente sabe que foi divulgado que os clubes se reuniram para fechar um acordo de não contratar atletas que buscassem a justiça.
Foto: Arquivo pessoal
Perdas de verbas de patrocínio
É grande a lista de mulheres que perderam verbas de patrocínio nos últimos dois anos por estarem ou desejarem ficar grávidas. Atletas olímpicas, inclusive. A espanhola Blanca Manchón, da Vela, a francesa Mélina Robert-Michon, medalhista no lançamento de disco. No atletismo americano, Alysia Montaño, Kara Goucher e a seis vezes campeã olímpica Allyson Felix. Os casos delas se tornaram públicos em 2019. Foi quando a patrocinadora mudou a política em relação ao contrato das gestantes, que passaram a ter os salários garantidos. E foi quando Allyson Felix, diante da filha de onze meses, se tornou, entre homens e mulheres, a maior medalhista do atletismo na história dos Mundiais, em Doha, no Catar. Ao expor o problema, Allyson trouxe o tema ao debate e ressaltou a importância de colocar a questão nos holofotes.
Nossas vozes são poderosas
— Allyson Felix
Foto: Patrick Smith/Getty Images
Foto: Getty Images
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