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Por Dodó Carvalho

Depois de vivermos uma crise hídrica das mais severas, com os principais rios alcançando níveis históricos de baixa, nas próximas semanas deveremos começar a sair do fundo do poço. O Rio Solimões já começou a encher, o Madeira iniciará em breve seu processo de cheia, e os sinais positivos vão aos poucos aparecendo.

Isso não significa que houve exagero, gritaria ou reclamações sem sentido durante os três meses mais agudos de seca. Vivemos dias muito difíceis, com um forte impacto sobre a população ribeirinha, sobre as atividades comerciais e, de forma mais ampla, sobre o estilo de vida do amazônida.

Nesse período, tenho viajado muito e visto de perto o sofrimento da população, as restrições à circulação e a imensa dificuldade para fazer chegar até mesmo alimentos. E o que mais me preocupa é que, se não fizermos nada, no ano que vem poderemos estar repetindo todo esse ciclo.

Alguns passos estão sendo tomados, é verdade. O Plano Geral de Outorga (PGO) desenvolvido pela Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) foi aprovado há um ano e passa por consultas públicas para ser discutido pela sociedade. E o plano é uma medida essencial para nosso futuro.

Desde 2010, com poucas ações efetivas de estruturação das hidrovias, o tamanho da rede hidroviária economicamente utilizada manteve-se em torno de 19 mil km. Os principais investimentos aconteceram no desenvolvimento de terminais portuários. É possível fazer mais.

Segundo a Antaq, os rios Amazonas, Solimões, Negro e Madeira já têm toda sua extensão navegável ocupada. Isso significa que, considerando os trechos de rio que podem ser navegados para atividades de transporte, não temos para onde crescer a malha de hidrovias. Por isso, agora é hora de cuidarmos melhor daquilo que Deus nos deu.

E talvez esse seja o principal problema da nossa relação com os rios da Amazônia. Como eles sempre estiveram por aqui, nem sempre damos a devida atenção. É uma inversão de valores que precisamos corrigir – e rápido, para o bem da nossa economia.

Já deixando claro que considero justo e necessário o asfaltamento da BR-319, não vejo o mesmo tipo de preocupação, iniciativa e mesmo de interesse da população quando se fala em fazer a dragagem, a sinalização e a segurança dos rios. É ainda mais importante cuidar da hidrovia, aumentando sua capacidade de transporte de cargas e de passageiros.

Em países como EUA, China e Alemanha, vemos uma grande importância dos rios e o cuidado que toda a sociedade tem com eles. Aqui, parece que temos raiva do que recebemos da natureza. Os produtores rurais do Mato Grosso, que enxergam o potencial de transporte da produção agrícola, têm dado o valor devido. Afinal de contas, são nossas hidrovias que fazem a soja brasileira ser competitiva em todo o mundo. Isso deveria nos encher de orgulho.

A possibilidade de outorga do Madeira, para que a iniciativa privada realize a sinalização, dragagem e organização dos espaços do rio, é muito bem-vinda. Mesmo com um custo em torno de R$ 0,80 por tonelada para quem utilizar a hidrovia (a população ribeirinha e o fery boat de passageiros não pagarão), os benefícios superam de longe as despesas.

É, de certa forma, o que aconteceu com as estradas concedidas à iniciativa privada no Sudeste. Ande de carro no interior de São Paulo e você percorre estradas que poderiam estar em qualquer país da Europa. Há um custo, sem dúvida, mas o benefício é infinitamente maior. Assim como aconteceu nesse caso, nas hidrovias teremos uma qualidade de serviço que o governo hoje não consegue oferecer.

Todas as rodovias e aeroportos brasileiros concedidos à iniciativa privada melhoraram seu nível de serviço. Se tornaram mais ágeis, modernos e organizados. Agora é hora de fazer o mesmo com as hidrovias, que são o meio de transporte mais importante da região Amazônica e garante a posição do Brasil como o celeiro do planeta.

É estratégico. É essencial para o futuro da nossa nação.

 

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