A luta dos povos indígenas na voz de Thaline Karajá
O brasil reverenciou nas audições às cegas do programa The Voice, da Rede Globo, Thaline Karajá, cantora indígena, natural de Alter do Chão, Santarém, Pará. A intérprete entoou “Banzeiro”, de Dona Onete, e conquistou o coração de Carlinhos Brown. O jurado e a participante protagonizaram momento emocionante e necessário sobre representatividade e pertencimento.
A presença marcante e infelizmente pouco percebida de Thaline Karajá, levanta questionamento “inconveniente” que assombra o Brasil há mais de 500 anos: a visibilidade, ou melhor, invisibilidade indígena.
Invisibilidade “Histórica”
Percebe-se, nitidamente, a objetificação e a negação de identidade e história dos povos indígenas. Estes, por muito tempo foram considerados como ahistóricos, além disso, é alarmante a desconsideração desses indivíduos, justamente, como sujeitos históricos e não vítimas.
Limita-se a “participação” indígena a um contato colonizador/colonizado no período colonial, um longo e “viril” projeto genocida e, por fim, a extinção. Contudo, indígenas sobreviveram, embora estejamos tratando de um potencial genocídio. Assim, a população sobrevivente luta diariamente contra narrativas que usurpam sua voz e a localiza em um limbo histórico de abordagens ibéricas.
Mazelas antigas contemporâneas
A população indígena vem crescendo substancialmente, porém, ainda continua sendo vista como o “exótico”, o “diferente” e o “outro”. É “comum” tratar os povos indígenas como um “povo à parte”, presos ao passado remoto e não narrado, ligados ao Brasil, única e exclusivamente, pelo elo nefasto da colonização.
O que é impressionante é que apesar do exaltado “progresso” e do extermínio iniciado nos tempos coloniais, as populações indígenas vem respondendo com um considerável aumento demográfico demonstrando a contemporaneidade desses povos e, pasmem, enfrentando os mesmas lutas: injustiças, violência, descaso, invisibilidade, massacres, usurpação de seus territórios, etc.
Indígena como “herói nacional”
A ideologia falaciosa de José de Alencar do “índio” pacato e “civilizado” à moda europeia perdura até os dias atuais e é extremamente danosa. Toda a simbologia e misticismo que se derrama sobre os povos indígenas mostra-se como uma manobra para invisibilizá-los e mitigar seus direitos como sobreviventes de um projeto de extermínio.
Necessário entendermos que o processo de colonização foi e é sentido severamente pelos remanescentes dos povos indígenas, ademais, é urgente que se perceba e principalmente se repare essa flagrante ausência de preenchimento de espaços.
Por consequência, aos indígenas se atribui um nacionalismo romântico, poético e utópico, por óbvio, sem garantias e embebido em exclusão.
Desmistificações
Quando figuras como Thaline Karajá aparecem carregam não apenas seu talento e/ou capacidade, mas a representatividade de vários povos, já que, diferente do que se pensa, os povos indígenas são múltiplos e diversos e já existiram em muito maior número e continuariam a existir se não fosse pela “aculturação” nunca demandada.
Urge desmistificar a fraude do paraíso étnico que insiste em permear a discussão e dar notoriedade a uma das feridas mais severas e profundas da história do país. Faz-se isso expondo-se e reconhecendo-se como um país que já foi “genocida”, logo depois, repara-se os anos de agressão com políticas públicas eficazes.
É “simples”, o povo indígena demanda direitos não apenas homenagens póstumas.
Preenchimento de espaços e resistência
O Movimento Indígena é forte e mune o povo indígena contra as arbitrariedades atuais persistentes. Nas últimas décadas, os povos têm demonstrado grande poder de organização e mobilização.
A partir da ocupação por indígenas de espaços antes jamais imaginados, quais sejam, plenário, tv globo, administração pública, etc, o “homem branco” treme e se surpreende. A “sociedade” não indígena percebe-se não sozinha e indaga: Indígenas existem?
Protagonismo Indígena
Quando se percebe indígenas como protagonistas e não como meros coadjuvantes da história do Brasil, percebe-se que, de fato, o país é “plural” e “miscigenado”. As aspas não são por acaso, pois não se reconhece ou se protege tal pluralidade e miscigenação, só representa um despertar para a não dizimação – projetada, implementada e resistida – durante a colonização.
Thaline Karajá presente
Por fim, saudemos Thaline Karajá com propriedade a partir de agora. Entendamos o quão significativa é essa figura para um povo que lutou e luta pela sua existência e principalmente sejamos ouvintes e apoiadores da causa e pauta indígena.
Veja também: Portal Maloca – The Voice Brasil se curva ao talento da indígena Thaline Karajá
Foto: Reprodução/Gshow e Portal Maloca